Viver com a desertificação
Portugal perdeu 2,1% da população entre 2011 e 2021, descendo para 10,3 milhões de habitantes. A densidade demográfica média é 112 habitantes por quilómetro quadrado, mas 20% da população concentra‑se em sete municípios do litoral que ocupam apenas 1,1% do território, enquanto outro 20% reparte‑se por 208 concelhos que cobrem quase 66% do país. O Algarve e a Área Metropolitana de Lisboa foram as únicas regiões a crescer (3,6% e 1,7%, respectivamente), enquanto o Alentejo perdeu 7% e a Madeira 6,4% dos residentes. Esta desertificação altera paisagens humanas e económicas: serviços fecham, escolas perdem alunos e bombeiros lutam contra incêndios sem efectivos.
A Associação de Desenvolvimento Integrado da Rede de Aldeias de Montanha (ADIRAM) lidera um projecto que transforma aldeias das serras da Estrela e da Beira Interior em destinos de turismo sustentável. A rede promove inovação, empreendedorismo e cooperação internacional para dar nova vida às comunidades serranas. Em Unhais‑da‑Serra, Vale de Amoreira ou Alvoco das Várzeas, oficinas comunitárias ensinam novos ofícios, programas de voluntariado recuperam trilhos e casas e jovens casais encontram apoio para criar negócios locais.
O fenómeno dos nómadas digitais trouxe estrangeiros e portugueses de volta ao interior. Segundo a Associação de Nómadas Digitais de Portugal (DNA Portugal), fundada em Agosto de 2022, estes trabalhadores remotos permanecem meses a fio, criam empresas, renovam casas e integram‑se nas comunidades. A associação colabora com o Governo e autarquias para criar centros de trabalho e aldeias nómadas e já apoia comunidades em Lisboa, Madeira, Ericeira, Porto, Portimão e Lagos, com potencial para mais de 20 destinos em locais como a Serra da Estrela e a Costa Oeste. A missão é descentralizar o país e revitalizar o interior.
Apesar dos projectos, a luta é diária. A falta de transportes, os salários baixos e a falta de serviços de saúde e educação continuam a empurrar jovens para a cidade ou para o estrangeiro. No entanto, há sinais de esperança: a fibra óptica chega a aldeias remotas, novos programas de habitação incentivam famílias a instalar‑se, e cada vez mais portugueses urbanos procuram qualidade de vida no campo. Manter o Portugal profundo vivo exige políticas de coesão territorial, apoios à agricultura familiar, incentivos ao empreendedorismo local e uma aposta na cultura e na biodiversidade. O interior não pode ser apenas paisagem: é comunidade, economia e memória.