Corredores Verdes: A Nova Fronteira da Sustentabilidade Rural
Em Montalegre, no coração do Parque Nacional da Peneda-Gerês, o agricultor Manuel Rodrigues ergueu, há três anos, o seu primeiro talhão florestal junto ao lameiro que herdara do avô. "Sempre ouvi histórias de lobos e javalis que passavam aqui ao longe", conta-nos Manuel, apontando para o sapal recém-plantado com carvalho-alvarinho e amieiro. "Decidi não só cultivar batatas, mas também semear vida para que estes animais tenham onde se deslocar."
A ideia dos corredores ecológicos, já em voga noutros países europeus, tem vindo a ganhar terreno em Portugal. Em conjunto com a associação BiomaTerra, a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), dezenas de técnicos e voluntários estão a mapear antigas coberturas florestais e a identificar os pontos críticos de fragmentação do habitat.
Do Alto Minho ao Baixo Alentejo: Uma Rede em Expansão
Na freguesia de Vila Flor, distrito de Bragança, a professora universitária Ana Beatriz Sousa lidera um projeto de investigação na UTAD que estuda a conectividade entre manchas de carvalho-negral na serra de Montesinho e os soutos centenários de Freixo de Espada à Cinta. "Criámos pontes verdes com espécies nativas, mas também levámos apicultores locais a instalar colmeias para reforçar a polinização", explica Ana Beatriz, enquanto observa drones que monitorizam o progresso das plantações.
Mais a sul, em Évora, a empresa Alentejo EcoTech instalou, através de microcréditos agrícolas, faixas arbóreas ao longo de olivais em crise hídrica. O engenheiro agrónomo Ricardo Martins esclarece que cada corredor de sobreiros, medronheiros e zambujeiros funciona como refúgio para aves migratórias, como o abelharuco e o peneireiro, e como trincheira contra a desertificação.
Benefícios para a Agricultura e para a Biodiversidade
Além de facilitar a circulação de fauna, estes corredores verdes trazem vantagens para os agricultores: "As árvores atuam como quebra-ventos naturais e ajudam na retenção de água do solo", refere a técnica de ambiente da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo, Sofia Carvalho. "Registámos uma redução de 15% nas perdas de solo por erosão e um aumento de 10% na produtividade das culturas entre 2022 e 2024."
O ICNF confirma que, entre 2020 e 2024, o número de espécies protegidas avistadas em áreas intervencionadas cresceu 25%, incluindo espécies vulneráveis como a lontra-europeia (Lutra lutra) e o morcego-de-peluche (Myotis emarginatus).
Desafios e Perspetivas Futuras
Apesar do entusiasmo, o projeto enfrenta obstáculos: a falta de apoios consistentes da Política Agrícola Comum (PAC) e as resistências de alguns proprietários que receiam perder terreno produtivo. Em Moura, distrito de Beja, a junta de freguesia financiou campanhas de sensibilização e garantiu compensações por hectare cedido à floresta, mas poucos agricultores aderiram.
Para o presidente da BiomaTerra, João Lobo, a solução passa por "criar incentivos fiscais e planos de certificação de produtos 'amigos da biodiversidade'" que valorizem os agricultores na cadeia de valor. "Só assim poderemos replicar esta iniciativa em grande escala e garantir um corredor contínuo do Minho ao Algarve.
Os corredores ecológicos em Portugal são mais do que faixas de árvores: representam uma visão integrada de agricultura e conservação, onde o campo reconecta-se à natureza para benefício mútuo. Se o país quiser assegurar a sua riqueza natural para as próximas gerações, será preciso que cada agricultor, cada município e cada cidadão abrace esta ideia verde.