Uma diáspora jovem em fuga
Portugal tem assistido a uma verdadeira diáspora de jovens qualificados. Segundo o Observatório da Emigração, cerca de 850 000 pessoas entre os 15 e os 39 anos – quase 30 % desse grupo – emigraram nos últimos anos, muitas vezes motivadas pelos baixos salários e pelas condições laborais pouco atractivas. A taxa de desemprego jovem rondava os 22 % no segundo trimestre de 2024, quase quatro vezes superior à média nacional de 6,1 %, e o preço das casas em Lisboa e no Porto afastava qualquer sonho de autonomia. Entre 2008 e 2023, mais de 360 000 jovens deixaram o país em busca de melhores oportunidades.
A resposta fiscal do governo
Para tentar estancar esta fuga de cérebros, o governo lançou um regime de incentivos fiscais progressivos. Jovens com menos de 35 anos e rendimentos até 28 000 € beneficiam de isenção total de imposto no primeiro ano de trabalho, redução de 75 % entre o segundo e o quarto anos, 50 % do quinto ao sétimo e 25 % do oitavo ao décimo. A medida, que integra o orçamento de 2025, poderá beneficiar entre 350 000 e 400 000 pessoas e visa tornar Portugal mais competitivo para os seus próprios talentos. Além disso, o executivo de Luís Montenegro promete facilidades na aquisição da primeira casa através da isenção de impostos municipais e do financiamento de um programa de construção de 33 000 habitações até 2030.
O Programa Regressar e outras iniciativas
Em 2019, foi lançado o Programa Regressar, um pacote integrado que inclui cortes fiscais, apoios em dinheiro para despesas de mudança e assistência à reintegração no mercado de trabalho. O site oficial explica que o programa oferece benefícios fiscais, apoio financeiro aos emigrantes ou familiares que venham trabalhar em Portugal e uma linha de crédito para investimento e criação de negócios. O objectivo é criar condições atractivas para que os emigrantes voltem e contribuam para a economia nacional, compensando a perda de população activa e aliviando a pressão sobre os sistemas de protecção social.
Soluções pontuais vs. reformas estruturais
Apesar de louváveis, estas iniciativas podem não ser suficientes se não forem acompanhadas de reformas mais profundas. A fuga de cérebros não resulta apenas de impostos altos; decorre também da estagnação salarial, da escassez de oportunidades de carreira e de um mercado imobiliário desequilibrado. Incentivos fiscais temporários aliviam o fardo no curto prazo, mas correm o risco de serem uma solução de "colarinho" se não houver investimento sistemático em sectores inovadores, em investigação e desenvolvimento e na criação de empregos qualificados. Sem uma estratégia que combine políticas de habitação acessível, combate à precariedade laboral e estímulo ao empreendedorismo, Portugal poderá continuar a ver os seus jovens partirem.
Um futuro a construir
Para transformar a paisagem económica e social, Portugal precisa de apostar numa agenda que valorize o capital humano. Incentivos fiscais e programas de retorno são passos bem‑vindos, mas devem ser complementados por uma política de longo prazo que assegure salários dignos, condições de trabalho justas e oportunidades de crescimento profissional. A fuga de cérebros é um sintoma; a cura passa por tornar o país um terreno fértil onde as mentes brilhantes querem e podem ficar.