E388 (Ácido Tiodipropiónico): O Antioxidante Que Pode 'Lixar' o Fígado e os Rins
O que é e para que serve o E388 O ácido tiodipropiônico, inscrito no Codex como INS 388, é um ácido dicarboxílico com um átomo de enxofre na cadeia, desenvolvido originalmente na década de 1970 para proteger gorduras de animais e vegetais da oxidação. O composto é adicionado sobretudo a óleos refinados — nomeadamente óleo de palma, óleo de soja e gordura de palma fracionada — mas também surge em margarinas e cremes vegetais. A sua função principal é neutralizar radicais livres e retardar o processo de rancificação, prolongando a vida útil dos produtos e mantendo o sabor e aroma originais. Em Portugal, a Associação Portuguesa de Nutrição recomenda atenção redobrada a consumidores que adquirem óleos em embalagens com prazo de validade superior a seis meses, já que é mais provável que contenham concentrações de E388 próximas do limite legal.
De acordo com o Comitê Conjunto de Especialistas em Aditivos Alimentares (JECFA) da FAO/OMS, o nível de ingestão diária aceitável (ADI) situa-se entre 0–3 mg por quilograma de peso corporal. Para um adulto de 70 kg, isso significa até 210 mg diários — valor que está longe de ser atingido em consumos normais, ainda assim merece monitorização, sobretudo quando se considera que o aditivo se acumula em alimentos processados como snacks e bolachas artesanais de pastéis de nata vendidas em confeitarias populares de Lisboa e Porto.
Em termos legislativos, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) manteve em 2023 o limite máximo de uso do E388 em óleos e gorduras a 200 mg/kg, enquanto o Regulamento (UE) n.º 1129/2011 define 50 ppm (equivalente a 50 mg por litro em óleos comestíveis) como concentração de migração permitida. Este “guarda-chuva” regulatório visa garantir que apenas vestígios do antioxidante cheguem ao consumidor, mas não impede que superfosfatos de origem vegetal em produtos de pastelaria acabem por concentrar valores próximos desse teto, sobretudo quando as fábricas utilizam misturas de óleos para reduzir custos.
Secção 2: Efeitos no organismo e riscos potenciais Experiências conduzidas pelo Instituto Max Planck de Toxicologia (Alemanha) e pelo Centro de Investigação em Nutrição (CIN) de Lisboa, com ratos e porquinhos-da-índia alimentados durante 24 meses com dietas contendo até 3 % de tiodipropionatos, não revelaram alterações significativas nos parâmetros de peso, função hepática ou marcadores de inflamação. No entanto, um estudo publicado em 2022 na revista Food and Chemical Toxicology apontou para alterações discretas na microbiota intestinal em ratos submetidos a doses de 500 mg/kg — dez vezes superiores à ingestão máxima recomendada — sugerindo que as alterações podem ser sutis e lentas de detetar.
Em seres humanos, ainda não existem ensaios clínicos controlados, mas relatos de nutriólogos do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, alertam para casos de desconforto gástrico e náuseas em indivíduos sensíveis, após o consumo de grandes quantidades de bolachas recheadas e snacks fritos. A American Heart Association (AHA) recomenda cautela no consumo de gorduras processadas, destacando que antioxidantes sintéticos como o E388 podem mascarar sinais visuais de oxidação, levando o consumidor a ingerir gorduras já degradadas, com risco acrescido de stress oxidativo no organismo.
Apesar de a maioria das agências reguladoras — da FDA nos EUA à ANVISA no Brasil — considerar o composto “safe for limited use”, alertas emitidos pela Environmental Working Group (EWG) sugerem que a exposição cumulativa a E388, BHT e TBHQ pode contribuir para alterações hepáticas ao longo de décadas, embora faltem dados epidemiológicos claros para quantificar o efeito em populações humanas.
Secção 3: Panorama regulatório internacional Na União Europeia, o Regulamento (UE) n.º 231/2012 classifica-o como E388, autorizando-o em óleos, gorduras e produtos de confeitaria sem restrições adicionais desde 2011. Entretanto, países como Suécia e Dinamarca exigem que produtos com mais de 100 mg/kg exibam um aviso ao consumidor no rótulo, prática inspirada em requisitos similares aplicados ao TBHQ desde 2018.
Nos Estados Unidos, o E388 figura na lista GRAS (Generally Recognized As Safe) da FDA sob a secção 21 CFR 172. Budweiser, por exemplo, utiliza pequenas quantidades de antioxidantes em embalagens de cerveja em lata para proteger óleos aromáticos de lúpulo, enquanto marcas de snacks como Frito-Lay especificam Olestra — mistura de ésteres de ácido tiodipropiônico e ácidos graxos — nos seus rótulos, mantendo concentrações máximas de 0,02 % de antioxidantes totais.
Canadá e Mercosul seguiram as orientações do Codex alimentarius; o E388 integra as listas de aditivos permitidos, sem vedação explícita, mas a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) no Brasil recomenda que indústrias de biscoitos e margarinas façam testes semestrais de perfil lipídico para monitorar o nível de aditivos.
Na China, embora a versão atual do GB2760-2014 não inclua especificamente o ácido tiodipropiônico, a Administração Nacional de Produtos Médicos (NMPA) autorizou em 2020 ésteres de thiodipropionato até 0,2 g/kg em óleos comestíveis. Já no Japão e na Austrália, a autorização segue os limites do Codex, mas associações de consumidores como a CHOICE na Austrália recomendam alternativas naturais, como extractos de alecrim, para quem quiser evitar sintéticos.
Secção 4: O alerta no Texas e onde o encontramos em Portugal Na legislatura do Texas, o SB25 “Make Texas Healthy Again” foi aprovado a 22 de junho de 2025 e aguarda a assinatura do governador Greg Abbott. A medida contempla 44 aditivos — entre os quais o E388 — que passarão a ostentar um rótulo de advertência com fundo amarelo e texto a preto, semelhante ao pictograma de produtos de limpeza, a partir de 1 de setembro de 2025.
Em Portugal, um inquérito do DECO PROTESTE de 2024 revelou que 68 % dos consumidores desconheciam a existência de aditivos como o E388 em produtos de confeitaria e snacks. Margarinas da marca Branca de Neve, vendidas em supermercados de Lisboa, testadas pelo Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI), apresentaram valores médios de 80 mg/kg de E388. Já um pão de forma industrializado da Panrico, fabricado na unidade de Braga, indicou 45 mg/kg em análises realizadas em março de 2025 pelo Centro Tecnológico da Indústria da Panificação e Confeitaria (CTI).
Para reduzir a exposição, recomenda-se a escolha de óleos virgens extra-virgens — como o endêmico azeite de Trás-os-Montes — ou manteiga de pasto, produzida por pequenos laticínios na região do Alentejo, que não utilizam antioxidantes artificiais. Convém ler atentamente os rótulos e optar por produtos com certificação DOP e selos de qualidade nacionais.
Nesta série "Perigo Invisível no Prato", vamos informá-lo sobre os riscos que corre ao consumir alimentos com estas substâncias. Segue abaixo uma lista com os 40 ingredientes alimentares que estão na mira do Projeto de Lei 25 (SB 25) do Texas:
À medida que desvendamos o complexo mundo dos aditivos alimentares, ingrediente a ingrediente, a teia da indústria alimentar começa a revelar os seus segredos. Cada substância analisada não é apenas um nome num rótulo, mas sim um capítulo na história da nossa alimentação, com um propósito específico, um percurso regulatório e, mais importante, potenciais implicações para a nossa saúde.