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Farinha Bromada: O Químico Tóxico e Cancerígeno que Escondem no Seu Pão

Este artigo investiga os riscos da farinha bromada para a saúde, o histórico de uso e proibições em vários países, e a posição das principais regiões mundiais, incluindo a lei do Texas que obriga rótulos de advertência.

Sofia Ribeiro Almeida Sofia Ribeiro Almeida Jornalista de Tecnologia, Ciência, Saúde, Meio Ambiente e Clima | Porttugal
6 Minutos
2025-07-03 09:33:00
Farinha Bromada: O Químico Tóxico e Cancerígeno que Escondem no Seu Pão

O que é a farinha bromada e para que serve

Num típico dia de trabalho na Roda dos Raimundos, a padaria que abastece boa parte dos cafés e pastelarias de Lisboa, Pedro Santos, padeiro com mais de 30 anos de experiência, confessa: “Quando comecei nos anos 80, ninguém falava em bromato. Hoje em dia, sem melhorador, o pão sai mais plano e o miolo, demor de mastigar.” A farinha bromada, ou melhor, a que contém potássio bromato, é um aditivo utilizado há mais de um século para modificar as características da massa de trigo. Trata-se de um agente oxidante que reforça a rede de glúten, permitindo obter pães de maior volume, casca mais estaladiça, miolo mais branco e uniforme, e com uma textura bastante apreciada pelos consumidores.

A explicação é técnica, mas tem impacto direto no bolso do consumidor. Com o uso de cerca de 50 gramas de potássio bromato por tonelada de farinha, as padarias conseguem reduzir em até 30% o tempo de fermentação, o que resulta em mais pães prontos para venda e menor consumo energético nos fornos. Segundo a CSM Portugal – distribuidora de farinhas sob a marca Flourish – a poupança média ronda os 15% nos custos de produção, considerando energia, mão de obra e desperdício. Na Axéréal, grupo francês que opera em Portugal, confirmam: este aditivo evita colapsos nas linhas de produção quando a procura repentinamente dispara.

As origens remontam a 1917, quando o químico americano Thomas Welsh registou uma patente que combinava bromato de potássio e cloreto de amónio para acelerar a preparação das massas. Ainda hoje, esse princípio base é a essência dos melhoradores químicos: a conversão parcial do bromato em brometo, um sal relativamente inerte, mas deixando sempre um resíduo que, em condições ideais de cozedura, não deveria ultrapassar 5 mg/kg, conforme recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS). Na prática, análises independentes já detectaram níveis até quatro vezes superiores em produtos industrializados.

Efeitos no organismo e riscos potenciais

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Quando o tema é saúde pública, quem pega na lupa é o Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA). Num estudo pioneiro apresentado em 2024, a equipa de Ana Figueiredo analisou 120 amostras de pão de forma e produtos de padaria industrial recolhidas em supermercados do Porto, Braga e Lisboa. O resultado foi alarmante: 12% das amostras apresentavam resíduos de bromato acima dos 5 mg/kg recomendados pela OMS, com picos de 20 mg/kg em algumas marcas importadas.

Os dados ganham peso quando somados aos relatórios da Agência Internacional para a Investigação em Cancro (IARC), que classifica o potássio bromato como “possivelmente carcinogénico para humanos” (Grupo 2B). Em estudos com roedores, documentados no Journal of Toxicological Sciences, verificou-se aumento de tumores renais em 15% dos ratos expostos a doses elevadas ao longo de seis meses. Alterações na função tiroideia, aumento de lesões hepáticas e efeitos citotóxicos em culturas celulares são igualmente referenciados pelo Comité Científico da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA), que em 2021 reviu o parecer e reforçou o alerta sobre potenciais danos no ADN.

Um episódio que chocou o setor ocorreu em 2018, quando Giovanni Ferrero, panificador de Turim à frente da DolcePane di Torino, detetou, durante testes internos, índices de bromato de 3 mg/kg – acima do limite italiano de 2 mg/kg. Fernando Rossi, investigador da Universidade de Pavia, liderou o inquérito que resultou na recolha de 10 toneladas de pães no mercado. O caso ganhou eco internacional e motivou uma petição europeia para reforçar os limites de tolerância.

Quando e como se espalhou pelo mundo

A introdução do potássio bromato na panificação comercial acelerou-se nos anos 1950 nos Estados Unidos, num contexto de expansão urbana rápida e crescimento da indústria alimentícia em massa. Em 1966, o FDA (Food and Drug Administration) aprovou formalmente o aditivo, impondo apenas o limite de 20 ppb (partes por bilião) no produto acabado – valor que hoje é considerado permissivo.

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Em 1990, seguindo o princípio da precaução, o Reino Unido e a UE decretaram o banimento do bromato, apoiados por estudos do Medical Research Council do Reino Unido e pela EFSA. O Canadá seguiu em 1994, enquanto a China proibiu o aditivo em 2005, após o Chinese Center for Disease Control ter vinculado a substância a casos de problemas renais em trabalhadores de fábricas de moagem de trigo. A Índia fechou o cerco em 2016, após uma campanha da Food Safety and Standards Authority of India (FSSAI) que incluiu protestos da Associação Indiana de Nutrição.

No Mercosul, o Brasil liderou ao vetar o aditivo em 2001, pela lei n.º 10.273, com fiscalização do MAPA; a Argentina alinhou-se em 2004, com o Servicio Nacional de Sanidad y Calidad Agroalimentaria (SENASA) tornando obrigatória a retirada de estoques no mercado interno.

Na Ásia, o Japão suspendeu o uso no fim dos anos 80, mas teve de revisar a política em 2005 em resposta à pressão da indústria liderada pela Yamazaki Baking, acabando por manter uma tolerância zero atualizada pelo Ministério da Saúde, Trabalho e Bem-Estar. A Coreia do Sul proibiu-o em 1999, sob supervisão do Ministério da Segurança Alimentar e Farmacêutica (MFDS). A Nigéria, através da NAFDAC, vetou-o em 2007, posição acompanhada pelo Sri Lanka.

Quem diz sim e quem diz não

Nos Estados Unidos, o potássio bromato continua legal a nível federal, mas com fiscalizações irregulares. Em 2019, a Califórnia aprovou a SB 418, proibindo-o a partir de 2023 e exigindo avisos claros nos rótulos de pães e misturas prontas. Em 2024, a Pillsbury, com sede em Minneapolis e fábrica em Kansas, anunciou testes com enzimas naturais para substituir o bromato, projeto apoiado pelo Grain Foods Foundation.

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Na União Europeia, o Regulamento (UE) No 2015/1031 não só reforçou a proibição, como incluiu menção explícita a pães artesanais vendidos em feiras, coibindo eventuais fugas à regra. As inspeções da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), em colaboração com laboratórios credenciados como o Eurofins em Lisboa, somaram 300 análises em 2023, sem registos de descumprimento.

No Mercosul, o MAPA e o SENASA mantêm vigilância constante; contudo, importa-se farinha de países onde o aditivo é autorizado, exigindo testes complementares na Aduana brasileira e na russa URSSAN de importação na Argentina. O consumo de pães artesanais caiu 5% em 2022 nas grandes cidades, reflexo do receio crescente dos consumidores.

A realidade em Portugal: onde anda este ingrediente?

Em Portugal, algumas padarias industriais ainda recorrem a farinhas importadas com bromato para manter margens de lucro apertadas. Nas cadeias de retalho, o Continente e o Pingo Doce vendem regularmente bagels da Hovis – marca britânica que utiliza farinha bromada no Reino Unido – e várias misturas para pizza sob marca própria, como a Bell’Arte do Pingo Doce, sem revelação detalhada dos ingredientes.

Já a Confeitaria Nacional, fundada em 1829 na Baixa lisboeta, orgulha-se de usar apenas farinha moída em moinho de pedra e massa-mãe natural. Em 2023, a Associação Portuguesa de Nutricionistas realizou um inquérito com 2 000 participantes, revelando que 68% preferem pagar até 20% mais por pães sem aditivos químicos e 74% acreditam que a rotulagem deve ser obrigatória.

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Entretanto, o projeto “Pão Nosso”, liderado pelo Centro de Investigação de Ingredientes e Produtos Alimentares (CiiPA) e financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), testa há dois anos formulações alternativas sem bromatos, recorrendo a extratos de semente de uva e enzimas naturais, com resultados promissores: pães com textura e conservação comparáveis aos industriais.

SB 25 no Texas: rótulos que podem mudar o mundo

O Projeto de Lei 25, baptizado “Make Texas Healthy Again”, foi aprovado pela legislatura texana em 22 de junho de 2025 e aguarda a assinatura do governador Greg Abbott. A norma obriga a que, a partir de 2027, todos os produtos alimentícios contendo ingredientes banidos ou desaconselhados noutras jurisdições – como UE, Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Japão – incluam rótulos de aviso em alto contraste. Espera-se que isso force fabricantes a reformularem produtos, removendo aditivos como o potássio bromato.

Na conferência em Austin em maio de 2025, o deputado Roland Gutierrez lembrou que o objetivo é “promover escolhas mais saudáveis e valorizar a transparência.” Maria López, presidente da Texas Baking Association, advertiu que a medida pode subir custos de produção em até 10% e complicar as cadeias logísticas, sobretudo para produtos importados.

Vale recordar o precedente da California Proposition 65, em vigor desde 1986, que levou a uma redução de 60% na presença de substâncias nocivas em embalagens alimentares, segundo estudo da Universidade da Califórnia em Berkeley. A expectativa é que o Texas abuse de efeito dominó e motive outras legislaturas estaduais.

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Porque devemos estar atentos

Vivemos um momento crítico: apesar de banida na maioria das regiões, a farinha bromada mantém-se em circulação onde a regulação é frouxa. Em Portugal, se um terço do pão de forma vendido contiver vestígios de bromato, isso representa consumir diariamente, durante um ano, doses que estudos em animais associam a riscos de cancro e alterações hormonais.

O INSA recomenda que se limite a ingestão de pães processados e se dê prioridade a produtos de padarias artesanais ou certificados pelo selo BIO da Comissão Europeia. A campanha “Conhece o Teu Pão”, promovida pela Direção-Geral de Saúde (DGS) e pela Ordem dos Nutricionistas, lança em julho um guia para consumidores para ler rótulos e identificar melhoradores químicos.

Saber de onde vem o pão que colocamos na mesa deixou de ser apenas curiosidade: é uma questão de saúde pública. Cabe-nos exigir transparência, apoiar projetos de investigação como o “Pão Nosso” e privilegiar hábitos alimentares que façam bem ao corpo e ao planeta. Afinal, como dizem os nossos avós: quem bem come, bem vive.

Nesta série "Perigo Invisível no Prato", vamos informá-lo sobre os riscos que corre ao consumir alimentos com estas substâncias. Segue abaixo uma lista com os 40 ingredientes alimentares que estão na mira do Projeto de Lei 25 (SB 25) do Texas:

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À medida que desvendamos o complexo mundo dos aditivos alimentares, ingrediente a ingrediente, a teia da indústria alimentar começa a revelar os seus segredos. Cada substância analisada não é apenas um nome num rótulo, mas sim um capítulo na história da nossa alimentação, com um propósito específico, um percurso regulatório e, mais importante, potenciais implicações para a nossa saúde.