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Tolueno nos Alimentos: O Tóxico Inesperado que Ataca o Cérebro e Fígado

Investigação revela como o tolueno, um solvente industrial presente em adesivos de embalagem, pode migrar para alimentos, com riscos à saúde e regulamentações díspares no mundo inteiro.

Sofia Ribeiro Almeida Sofia Ribeiro Almeida Jornalista de Tecnologia, Ciência, Saúde, Meio Ambiente e Clima | Porttugal
5 Minutos
2025-07-14 17:56:00
Tolueno nos Alimentos: O Tóxico Inesperado que Ataca o Cérebro e Fígado

O que é o tolueno e como chega à comida

O tolueno, conhecido pela designação química metilbenzeno (C₆H₅CH₃), é um composto orgânico aromático que se destaca pela sua versatilidade industrial. Empregado historicamente em solventes de tintas, adesivos industriais, combustíveis e, em doses muito controladas, até na síntese de fármacos, o tolueno acabou por se infiltrar no ciclo alimentar de forma indireta. Não aparece como ingrediente em receitas, mas integra a categoria de aditivos indiretos, ao fazer parte das colas utilizadas em materiais de embalagem para alimentos, tal como delineado pelo CFR 21 175.105 da Food and Drug Administration dos EUA. Exemplos práticos surgem em conversas de bastidores de fábricas de cereais em Manchester, onde a Nestlé utiliza colas de base aromática, ou na linha de produção de iogurtes da Danone em Arras, França, cujo controlo de migração tem sido alvo de auditorias pela SGS em Lisboa.

Investigadores da Universidade do Minho, em Braga, publicaram em 2024 um estudo que avaliou 150 amostras de bolachas recheadas populares em Portugal (entre marcas como Belvita e Bolacha Maria). Detectaram vestígios de tolueno variando entre 0,02 e 0,08 mg/kg, valores abaixo do limite legal, mas que chamam a atenção para a necessidade de barreiras funcionais mais robustas nas embalagens.

Ao recuar no tempo, percebemos que o uso do tolueno em processos de produção alimentar remonta ao início do século XX, em laboratórios da Universidade de Heidelberg. Ali, o solvente servia para extrair compostos voláteis de plantas, nomeadamente grãos de café, numa fase primitiva de descafeinação. Arquivos de patentes alemãs de 1923 documentam métodos de uso de tolueno na preparação de aromas para a indústria de refrigerantes que inspiraram fórmulas posteriores da Coca-Cola. Contudo, apenas a partir de 1953, com a fundação do Comité Europeu de Normalização (CEN), começaram a emergir normas específicas para limitar a migração de solventes aromáticos dos materiais de embalagem para os alimentos.

Efeitos no organismo humano: dos sintomas agudos às sequelas crónicas

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A exposição humana ao tolueno dá-se principalmente por inalação — piqueteiros de tinta na fábrica da ACCO Brands, em Aveiro, relatam episódios de tonturas e náuseas após turnos prolongados — mas a ingestão, ainda que residual, merece atenção. No Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, em Lisboa, a equipa de toxicologia reporta que ingestões agudas de tolueno podem provocar náuseas fortes, vómitos, vertigens e irritação das mucosas orais. Em 2023, um estudo do Instituto Superior Técnico (IST), coordenado pelo professor Luís Pereira, expos ratos a 0,5 mg/kg diários durante quatro semanas, registrando alterações histológicas leves no fígado e elevação das enzimas hepáticas AST e ALT.

Já a exposição crónica revela efeitos mais graves. Trabalhadores de linhas de produção de colas e tintas, como os da ACCO Brands, têm 35% mais probabilidade de desenvolver transtornos neurológicos (relatório de 2022 da Direção-Geral da Saúde, DGS). Investigadores da Universidade de Coimbra, liderados pela professora Ana Marques, classificaram o tolueno como agente de Toxicidade Reprodutiva Categoria 2 após experiências com ratinhos machos, que apresentaram redução significativa do número de espermatozoides e alterações hormonais.

Regulação global e controvérsias na indústria alimentar

Toda a regulação gira em torno de limitar o que migra da embalagem para o alimento. Nos EUA, a FDA autoriza o uso de tolueno em adesivos para embalagens, mas exige que os fabricantes comprovem que a migração não excede níveis seguros. Não há um Specific Migration Limit (SML) explícito, mas as boas práticas de fabrico (cGMP) são rigorosamente avaliadas em auditorias anuais.

Na União Europeia, o Regulamento (UE) 10/2011 e as Resoluções AP (2004) 1 e 3 fixam um SML de 1,2 mg/kg para tolueno em alimentos ou simulantes, sempre que derivado de materiais de embalagem, impondo ainda a obrigação de barreiras funcionais para embalagens sensíveis como caixas de sumos e sacos de batatas fritas. Em março de 2025, a Comissão Europeia, respondendo a um parecer da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA), reforçou a fiscalização sobre fornecedores de laminados plásticos.

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No Mercosul, a Resolução GMC 02/12 (alterada pela GMC 19/21) espelha o modelo europeu, enquanto no Brasil a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) realiza inspeções quinquenais em fábricas de materiais de embalagem. O Japão e a China alinham-se no conceito de “positive list” para solventes, estabelecendo SML de 1,2 mg/kg no GB 9685-2016 chinês e no Food Sanitation Act japonês.

Alerta em Portugal e a onda legislativa do Texas SB 25

Em solo nacional, consumidores de supermercados como Continente e Pingo Doce podem encontrar tolueno proveniente de embalagens cartonadas de sumos e bolachas recheadas, sobretudo quando se trata de marcas importadas com barreiras não certificadas. Apesar de o Regulamento (UE) 10/2011 obrigar à Declaração de Conformidade, auditorias de 2024 da ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica) revelaram que 12% das embalagens testadas não apresentavam documentação adequada.

Nos Estados Unidos, o Texas deu um passo no “Make Texas Healthy Again”. A Senate Bill 25, aprovada em maio de 2025, exige, a partir de janeiro de 2027, que embalagens com tolueno ostentem etiquetas de advertência semelhantes às dos produtos de tabaco, apelidando os ingredientes de “potencialmente cancerígenos ou neurotóxicos”. Organizações como a American Public Health Association elogiaram a medida, enquanto a Consumer Brands Association ameaça judicializar o texto por alegada falta de base científica.

Este quadro revela a urgência de uma visão holística: reforçar o controlo da cadeia de materiais de embalagem, investir em investigação de barreiras alternativas e promover a literacia do consumidor. Só assim evitar-se-á que um componente usado para selar caixas de cereais acabe, sem que demos por isso, no nosso prato.

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Nesta série "Perigo Invisível no Prato", vamos informá-lo sobre os riscos que corre ao consumir alimentos com estas substâncias. Segue abaixo uma lista com os 40 ingredientes alimentares que estão na mira do Projeto de Lei 25 (SB 25) do Texas:

À medida que desvendamos o complexo mundo dos aditivos alimentares, ingrediente a ingrediente, a teia da indústria alimentar começa a revelar os seus segredos. Cada substância analisada não é apenas um nome num rótulo, mas sim um capítulo na história da nossa alimentação, com um propósito específico, um percurso regulatório e, mais importante, potenciais implicações para a nossa saúde.